quarta-feira, 7 de abril de 2010

Texto sobre a educação judaica

O autor do texto abaixo preferiu ser identificado apenas como um judeu, pai de três filhos, ativista de Movimento Juvenil nos anos 90, com pós-graduação em Israel.

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Apenas 4 anos após a queda do muro de Berlim (1993) estava em um encontro dos movimentos juvenis e um palestrante falou: "no futuro o mundo pos-moderno será ambivalente, altamente globalizado porem ao mesmo tempo sectário ao extremo". A cada ano que passa, dentro da revolução das comunicações que vivemos hoje vejo o quanto foi profética a palestra deste professor. Ao mesmo tempo em que nos diluímos na sopa global e podemos "twittar" com o mundo inteiro, ter acesso imediato a informações sobre tudo e prover informacoes em tempo real, o sectarismo nos puxa como um ima. Cada grupo quer fortalecer e diferenciar mais e mais sua identidade. Hoje o "ser eu mesmo" acaba significando muito mais "não ser ele".

Em Israel, por exemplo, este fenômeno é muito claro. Se na época de Ben Gurion se tentou criar um amalgama social e cultural único, hoje cada etnia judaica tenta se diferenciar e preservar ao máximo sua cultura, tradições e identidade. Isso vale tanto para origem quanto para linha religiosa adotada. Generalizando (obvio que existem muitas exceções), os laicos ao invés de estudarem profundamente a tradição e historia como faziam seus antecessores, se apegam muito mais em atitudes anti-religiosas. Já os religiosos, se preocupam muito mais em negar totalmente a cultura laica do que tentar absorver aspectos positivos e construtivos da mesma.

Como criar e educar os filhos neste mundo pos-moderno? Como prover a eles um judaísmo vivo, porem inserido neste mundo competitivo com demandas materiais globalizadas e difíceis? Como evitar que o judaísmo não seja um canal de expressão de sectarismo?

O mundo pode mudar, mas a mente humana desde os tempos mais longíquos se mantém com os mesmos axiomas emocionais. Tanto que Freud se utilizou de mitologia grega para entender os mecanismos psicopatológicos no início do século XX. A criança sempre teve e terá muita dificuldade com a dupla mensagem. A ambivalência gera duvida. A educação judaica pode acabar caindo no abismo da dupla mensagem. Pois ao mesmo tempo em que provemos aos nossos filhos a educação mais "up-to-date”, incutindo os valores de empreendedorismo, iniciativa e criatividade, tentamos mostrar a importância do judaísmo. Hoje em dia, em todas as áreas do conhecimento só o novo é valorizado. Na medicina, por exemplo, um livro com conceitos de 5 anos atrás, provavelmente virara peso de papeis. Outra questão é o poder de síntese da informação, hoje em dia um pedaço de informação com mais de 140 caracteres é considerado "longo" demais.

Eu vejo a educação judaica neste novo milênio como um tripé. Neste tripé estão: tradição, história e idioma.

A tradição seria os conhecimentos e valores milenares que os textos religiosos e literários descrevem. Muitas pontes entre estes textos e os dias de hoje são encontradas. E encontrando estas pontes se pode aprender e adotar os demais pontos com maior facilidade. Um exemplo fascinante é como a Tora é "green"- o mundo desligou as luzes por uma hora no ano passado e parecia que Messias iria chegar, a Tora pede que no fim de um ciclo de 6 dias, o sétimo seja uma reciclagem: sem carros poluindo, sem eletricidade e energia gastando e sem trabalho para que os neurotransmissores do cérebro humano se reciclem. Esse é apenas um exemplo, mas com certeza a Tora não é um documento morto, ela em viva, dinâmica e pode participar das nossas relações pessoais e sociais. Muito mais que uma idolatria aos rituais e uma jurisprudência ao sectarismo, eu vejo o estudo da Tora como uma pratica saudável, intelectualmente desafiadora e extremamente educativa.

O segundo pilar é a historia. Antes de nos tornarmos uma religião, já éramos um povo. Ensinar a historia para os filhos é fundamental, seu conhecimento profundo gera paralelamente um ganho secundário: entender a historia universal. Participamos de todas as etapas da historia ocidental, por tanto uma visão critica e objetiva da historia judaica é uma ferramenta cognitiva impar para os nossos filhos. O entendimento dos processos históricos contemporâneos certamente provera uma identificação com a criação de um estado judeu em uma porção da terra de Israel, o sionismo. Assim como o desentendimento gera uma assimilação de conceitos superficiais e errôneos, como o de que sionismo é se assentar em toda a terra de Israel.

Finalmente o idioma. O renascimento do "evrit" tem que ser celebrado e seu ensino nas escolas judaicas é crucial. A pergunta clássica é: Qual a utilidade de ensinar o hebraico, no mundo de hoje seria melhor ensinar mandarin? Eu Vejo a fluência em hebraico como fundamental na sustentação dos dois pilares anteriores. A experiência plena e autônoma no estudo das tradições e historia é obtida apenas com o evrit.

Ninguém tem a solução para educação da "dor emshech" (próxima geração). No passado alguns livros antigos, uns polígrafos xerocados da enciclopédia judaica e o quadro negro eram o que parecia suficiente para nos ensinar. Hoje o acesso ao conhecimento é quase infinito e muito fragmentado, eu chamaria de "era do nano-conhecimento". Eu não quero que meus filhos abandonem o judaísmo para poderem se inserir no mundo globalizado e também não quero que eles usem o judaísmo como válvula de escape para se afastar dele. O bom judeu deve ser capaz de construir um mundo melhor e sustentável. O judaísmo nas suas tradições, história e idioma deve ter papel de catalisador na melhora do entendimento e das relações da nova geração com o mundo.

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