terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Imperfeita

A Sababah segue recebendo textos interessantíssimos! Henrique Cardoni analisa o documentário nazista "Deusa Imperfeita". Quer ser o próximo a publicar o seu texto em nosso blog?? Basta enviar o material para sababahpoa@hotmail.com!

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Esse texto eu escrevi para a faculdade na cadeira de Semiótica, na qual vimos um documentário chamado “A deusa imperfeita”, que narra com detalhes a trajetória de Leni Riefenstahl, cineasta alemã que dirigiu filmes nazistas como “O Triunfo da Vontade”, possivelmente o maior expoente do cinema nazista. No documentário Leni se defende das acusações de que era partidária da ideologia nazista, na verdade o filme A deusa imperfeita faz quase que uma defesa a Leni, a tratando como uma grande artista.

Imperfeita

O filme O Triunfo da Vontade começa citando os 20 anos passados desde a primeira guerra mundial, na qual a Alemanha foi subjulgada e condenada a pagar pesadas multas de guerra, refreando a economia de tal forma, que durante duas décadas o país foi assolado por crises e inflações, tornando até mesmo os produtos mais simples fortunas. A frase inicial é “5 de setembro de 1934, 20 anos depois do começo da primeira guerra mundial, 16 depois do começo de nosso sofrimento, passados 19 meses do renascimento alemão, Adolf Hitler entra novamente em Nuremberg.”

Eis que cresce a geração dos derrotados, cresce sobre uma ótica de rancor, cresce com a ânsia de voltar à triunfar. Hitler foi na verdade um canalizador desse rancor, foi o ícone eloqüente capaz de unificar e mobilizar um povo que ansiava por mudanças. O filme O Triunfo da Vontade de Leni Riefenstahl, fala sobre isso, sobre unificação em prol de uma causa, sobre a massa e o poder, sobre o triunfo épico da vontade de uma nação.

Desfilando entre multidões uniformes e discursando para duzentos mil soldados milimetricamente posicionados Hitler diz: “não foi o chamado do estado que os trouxe aqui, mas sim o chamado de seus próprios corações” e isso é a mais pura verdade, a adoração quase religiosa dos alemães da época pelo seu líder foi capaz de mobilizar milhões, que guiados maquiavélica e primorosamente reergueram o país. Dizer que Leni Riefenstahl foi uma Deusa imperfeita é o mesmo que dizer que Hitler foi um Deus imperfeito e isso é inaceitável. Ela foi uma mulher talentosa, mas só mais uma que compartilhava e surfava na mesma onda que todo o povo alemão, mais uma que cresceu em um país falido, mais uma que viu a reviravolta nas palavras de um líder e mais uma que preferiu não ver o que não queria. Sem dúvida O Triunfo da Vontade é um filme artístico, mas mais do que isso, ele é passional, é uma prova de amor a Hitler e uma jura de fidelidade ao seu ideal.

A beleza estética do filme se baseia mais na perfeição das multidões e estandartes do que em qualquer coisa, não existe individuo se não o de Hitler, que em seus discursos sempre frisa a unidade alemã, perfeita e homogênea. Ao discursar para os jovens o líder fala: “Veremos as margens do que plantamos e criamos, mas seguiremos adiante e com os outros a Alemanha viverá e quando não existir rastro de nós, a Alemanha viverá. Não existe caminho se não o caminho de nossa causa, afinal, vocês são sangue do nosso sangue, e quando erguermos os pilares da vitória vocês também estarão neles.”

O filme de Leni Riefenstahl é o reflexo da ideologia de Hitler, da unidade de um povo, de uma força estabilizadora, da devoção de uma massa, da loucura megalomaníaca de um homem, da dissolução do individuo em prol do coletivo, da homogeneidade e da arianidade.

O filme não fala sobre pureza racial, mas ela está implícita em tudo ele mostra, Leni prefere sempre mostrar a beleza ariana e a câmera sempre procura os mais belos.

Não existe desculpa ou perdão para nenhum alemão que já ergueu seu braço para Hitler, Leni Riefenstahl, assim como todo o povo alemão, sempre soube de tudo que acontecia nos campos, eles enviaram seus vizinhos judeus à morte e isso nunca foi problema, afinal, os judeus não eram alemães como eles, seriam um câncer na perfeição de suas tropas bem dispostas.

Os judeus eram roubados e aprisionados no meio do nada entre tapumes, para que ninguém tivesse que ver, lá eram mortos em banheiros vazios, para que ninguém tivesse que ver, seus corpos eram queimados, para que ninguém tivesse que ver.

Até mesmo para um soldado nazista anti-semita desde o nascimento era difícil balear uma mãe e um filho, as câmaras de gás foram criadas não só para otimizar o processo industrial da morte, mas também para pupar os soldados de ver a chacina, até mesmo a queima dos corpos eram feitas por judeus que recebiam mais tempo de vida por fazê-lo. A verdade sempre esteve ali, mas posta de forma que ninguém tivesse que ver, Leni sempre soube de tudo isso e covardemente escolheu não ver, atendeu ao pedido de seu mestre e, de forma genial, louvou a Alemanha nazista, homogenia, poderosa, cruel e horrenda.

Henrique Cardoni

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